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Do abandono da militância libertária


Hans-Hermann Hoppe, um dos maiores (talvez o maior da atualidade) do libertarianismo moderno.






















O que mais me encanta nessa conversão é o desapego de qualquer ideologia e posição política. Nunca fui apegado com política, mas o libertarianismo me atraiu de uma forma que quase me cegou em certo período.
Lembro-me que sempre quis pagar de radical e polêmico, mas com o tempo percebi que não era necessário ser tão polemista, mas acima de tudo coerente com o que defendo. Isso me fez garantir uma faminha razoável até. Mas nada que possa ser comparado com outros militantes mais conhecidos.
De 2013 até o fim de 2016, quando definitivamente larguei a militância libertária, escrevi para diversos sites. De uma posição meio progressista até uma mais conservadora. Porém, em meados de 2016 a conversão veio. Assim como o meu ateísmo – aparentemente inabalável até então – desmoronou, a minha “fé” no libertarianismo também foi junto. Não porque acho inviável ou coisa do tipo, não por achar o estado pode ser legítimo ou não, mas porque acima de tudo não via mais motivos para me dizer libertário.
O motivo é muito simples: se declarar libertário é um comprometimento com uma linha de pensamento. Não com a verdade em si. Uma vez que nos comprometemos com uma linha de pensamento, negamos a busca da verdade. Ela deixa de ser a conformidade da nossa inteligência com a realidade e passa a ser a conformidade da realidade com a nossa vontade. Tudo tem que passar pela rigidez do raciocínio comprometido com uma linha de pensamento cujo fim é a mudança da realidade externa. A mudança das pessoas que nos cercam.
Por muito tempo fui influenciado por diversos pensadores, mas colocarei aqui basicamente três: Hans-Hermann Hoppe, Murray Newton Rothbard e Ludwig von Mises. Os três com pensamentos seculares e em certo nível anticlerical. Principalmente o Mises. Mas dou o braço a torcer: ainda reconheço que são analistas brilhantes no campo econômico, mas não vou focar nisso.
As análises de Mises – que não era libertário, mas que deu as bases para o libertarianismo moderno – ainda me influenciam quando observo certos fenômenos econômicos. Aprendi muito lendo o tijolo Ação Humana, mas nesse mesmo livro Mises critica a religião como se fosse algo irracional. Rothbard em A Ética da Liberdade critica a Igreja pelo seu posicionamento contra o aborto e ainda disse que o pensamento agostiniano é contra a razão (como se o Santo Agostinho, o mais importante padre da patrística, fosse contra a razão). São posições não apenas contrárias à Igreja, mas contrárias a própria verdade.
Mas no caso do Hoppe o caso é ainda mais sério. Hoppe é menos conhecido que esses dois, mas ele foi quem me formou intelectualmente como libertário militante. Principalmente com a sua ética argumentativa. Todavia, devo confessar que ela desmoronou com o fim do meu ateísmo. A ética argumentativa sugere que a ética não é bem uma realidade externa, mas é algo cuja estrutura depende da nossa capacidade de argumentar. Isso foi uma conclusão do próprio Hoppe, em Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo. Ou ainda: ignora quem nos deu tal capacidade, que foi Deus.
E o que o fim do meu ateísmo tem a ver com isso? Ora, se existe Deus, a ética deve ser uma realidade externa determinada por Ele. Sendo Deus o Criador de tudo, Ele também é o Senhor de tudo. Logo, crer na ética argumentativa e ser cristão são duas coisas incongruentes. Hoppe ao escrever os seus livros, principalmente Democracia – o deus que falhou, fez análises e formou teses interessantíssimas, mas falha ao excluir Deus dos seus estudos. Ignora que mais do que a introdução da democracia no Ocidente, o que também piorou ainda mais a situação atual da Europa foi a perda da fé católica. Sem a fé, disparou o número de abortos, divórcios, fez surgir leis favoráveis a homossexuais, mães e pais solteiros e toda sorte de aberrações. O trabalho de Hoppe até certo ponto foi muito nobre, mas não tem como escrever sobre algo tão profundo e ainda mais no Ocidente ignorando Deus e o papel da Santa Igreja. Hoppe ignorou a Revolta (me recuso a chamar isso de Reforma) Protestante, por exemplo, que aumentou totalmente o poder do estado e abriu espaço para outros eventos lamentáveis como a Revolução Francesa. Posso até crer que talvez seja o fato dele ser de família luterana, mas é mais provável que o seu agnosticismo o impeça de enxergar uma peça que poderia tornar a sua obra quase perfeita para qualquer leitor.
Mas devo confessar que a leitura de Hoppe me ajudou de certa forma me aproximar do cristianismo, mas ao ver a minha fé evoluir, isso me afastou do libertarianismo também. Mas sem Hoppe seria capaz de ainda ser um libertário pós-moderno longe de me converter. Me resta rezar por ele. Ele me impediu de mergulhar nas trevas mais escuras que poderia mergulhar. Hoppe sem dúvida foi uma peça fundamental para a minha conversão e o afastamento daquilo que ele mesmo defende.
Direita, esquerda, centro…? Nada disso. Apenas católico.

 fonte: Luciano Takaki – Medium

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