Marcelo Nobrega / Diretor de Recursos Humanos - Arcos Dourados
No
meio de tantos prêmios e polêmicas que o filme colecionou na época do
lançamento, em 1998, uma cena passou meio despercebida em A Vida É Bela!,
do italiano Roberto Begnini: aquela em que o gerente do restaurante do
hotel, Eliseo Oferice, corrige a postura do sobrinho Guido (o próprio
Roberto Benigni), que tenta iniciar-se na carreira de garçom. Vendo o
sentimento inadequado de servilismo do moço, o tio experiente diz:
“Servir é a arte suprema. Lembre-se, Deus é o primeiro servidor. Ele
serve os homens o tempo todo – mas não é nosso servo”.
Aspectos religiosos à parte, o filme me voltou à lembrança quando li a notícia de que os alunos do último ano do ensino médio de um colégio gaúcho tinham realizado uma festa à fantasia em que se questionavam sobre seus futuros, num tom debochado: “E se tudo der errado?”.
A história causou muita indignação: As vestimentas nas fotos divulgadas nas mídias sociais faziam graça de profissionais de limpeza, zeladoria e atendentes de lanchonete. Tenho certeza de que não houve intenção maldosa, apenas uma iniciativa inocente.
Afinal,
mentes jovens são altamente influenciáveis pelo ambiente em que vivem e
florescem – um ambiente, por sinal, dominado atualmente por ideias
distorcidas, sobre o que seja o sucesso.
Com sua valorização inflacionada da importância de alguns fatores (bens materiais e celebridade, por exemplo), o mundo contemporâneo tem levado os desavisados a investir na busca de algo que ainda não têm – e que, talvez, nem sequer desejaram. Qualquer coisa menor do que isso seria sinal de fracasso, humilhação, servilismo. Eis aí, uma visão míope do que é ser bem-sucedido ou “dar certo na vida”. Pior: é a receita – infalível – para a infelicidade.
“E se tudo der errado?”. Nesta especulação, tão curta, existem no mínimo três falsas premissas.
O primeiro equívoco é presumir que uma pessoa – e tudo aquilo que ela representa – possa se reduzir à sua ocupação profissional ou a uma simples relação empregatícia. Mas a verdade é bem maior do que isso. O trabalho que gera nossa renda e sustento não nos define plenamente: na vida em sociedade, estamos sempre desempenhando diversos papéis. Também somos filhos e maridos, pais e vizinhos, amigos ou colegas de trabalho, parceiros de lazer nos fins de semana. Somos, em suma, cidadãos de uma comunidade, membros de cidade, habitantes de um país – mais até, do planeta. E cada um desses relacionamentos envolve aspirações e expectativas, direitos e deveres.
Já de saída, vale lembrar que nosso primeiro papel é o de filho – e que não estreamos vestidos. Entramos nessa festa literalmente nus, totalmente despidos de rótulos e preconceitos. Aos poucos, vamos vestindo os outros adereços. E pode ser lugar comum, mas é também uma verdade clara e simples: se todos desempenhassem com um mínimo de empenho e eficiência todos os seus papéis, por certo viveríamos num mundo mais justo, equilibrado e feliz.
Eis aqui o segundo ponto: riqueza e popularidade não definem sucesso – e os exemplos e contraexemplos são abundantes. A mídia não se cansa de mostrar como políticos corruptos, traficantes e contrabandistas conseguem amealhar fortunas – mas nem por isso podemos considerá-los pessoas bem-sucedidas.
Não é uma exclusividade de malfeitores: alguém pode garantir que Michael Jackson e George Michael tenham sido pessoas felizes – apesar de ricos e idolatrados por milhões de fãs em todo o mundo? E agora gire a luneta na direção oposta: Madre Teresa de Calcutá – canonizada em setembro do ano passado pela Igreja Católica – não possuía de seu nada além da roupa do corpo, na hora de morrer. E, ao que parece, morreu feliz.
Mas voltemos ao mercado de trabalho – porque é nele que se encontra o terceiro ponto negativo da brincadeira infeliz dos desavisados jovens da nossa história: a motivação.
Um emprego é o nome genérico que damos ao trabalho remunerado em que aplicamos nossas habilidades e iniciativa com o objetivo de alcançar as metas desejadas por uma determinada empresa. É ali, na prática diária do emprego, que temos a chance de aperfeiçoar essas habilidades pessoais. É nesse ambiente que aprendemos a conviver e trabalhar com outras pessoas, a pensar no bem da equipe, da empresa e da sociedade – e é ali que, por conta de um trabalho bem feito, que aumentamos nossa autoestima, acumulamos satisfação pessoal e realização profissional.
É no desempenho do trabalho que chegamos a concretizar sonhos e atingir objetivos íntimos de vida. Já dá para ver que trabalhar numa organização – qualquer organização – é um fenômeno complexo, que envolve algumas condições individuais e circunstanciais, tais como: saber, querer e poder fazer. E é errado pensar que todos tenham a mesma motivação no trabalho. Isso envolve toda uma série de fatores intrínsecos e extrínsecos: de um lado, gostar de realizar a tarefa; de outro, as recompensas externas, como reconhecimento, salário ou status – sem falar nos chamados aspectos “transcendentais”, relativos ao impacto daquele papel ou posição sobre os demais integrantes do grupo.
“Conhece-te a ti mesmo!”: era a frase inscrita na entrada do Templo de Apolo, na Grécia Antiga – que servia de inspiração a Sócrates, o pai da filosofia. Talvez a falta desta receita antiga – o autoconhecimento – esteja na raiz de tantas frustrações e tantos temores antecipados de que nada dê certo...
O que motiva você? O que faz você feliz? Na resposta ponderada a estas perguntas, está a receita para você encontrar sua vocação – e, mais do que conseguir uma carreira, sentir-se realizado e satisfeito. Isto é dar certo na vida! Mas a resposta errada e apressada pode ser a matriz de frustrações e ressentimentos.
Se você for olhar de perto, é fácil identificar uma pessoa que trabalha por amor ao que faz. Para dar um exemplo simples e objetivo: quando paro num posto de gasolina, quero sair com o tanque cheio, no menor prazo possível. Mas é bastante diferente a experiência de ser atendido por um frentista simpático, que diz “bom dia” com um sorriso nos lábios, sabe o seu nome, limpa o para-brisa, e se despede com um “volte sempre!”. Alguém discorda?
Certamente, todo trabalho merece ser remunerado, na medida em que supre uma necessidade: alguém é beneficiado pelo serviço ou produto solicitado. Nesse sentido, todo trabalho é, por definição, necessário – e digno.
Milionários, celebridades ou executivos de grandes empresas constituem uma parcela pequena da população. A contrapartida disso é que existem muitas e muitas pessoas com talento para (e que gostam de) ser porteiro, diarista ou atendente de lanchonete – justamente aqueles exemplos citados na brincadeira infeliz da garotada. São trabalhos dignos, necessários, que requerem talento como todos os outros – e por isso devem ser respeitados. E aplaudidos.
Graças ao trabalho de pessoas que servem ao próximo sem aquele sentimento de servilismo ou frustração de que falava o personagem do filme de Benigni, levo uma vida cercada de tranquilidade e segurança. Sou grato e aprecio o trabalho realizado pelos porteiros e seguranças do condomínio onde resido. E também os profissionais de limpeza e jardinagem que mantêm um ambiente agradável, limpo e bonito à minha volta. Gosto de ver as plantas, flores e frutas do jardim do condomínio e de minha casa. Quem não gosta disso? Em especial, sinto-me feliz de ver o carinho que minha diarista dedica ao meu lar e à minha família. Servir é uma arte. E cada um de nós, em seu trabalho, está sempre servindo aos outros.
Por isso, através da Fátima (minha diarista), Agnaldo (segurança do condomínio onde resido) e Wilson (gerente da minha lanchonete favorita), quero aqui expressar meu respeito e agradecimento a todos os profissionais que trabalham duro – e dizer a cada um deles o que eles já sabem e demonstram: eles deram certo na vida.
Aspectos religiosos à parte, o filme me voltou à lembrança quando li a notícia de que os alunos do último ano do ensino médio de um colégio gaúcho tinham realizado uma festa à fantasia em que se questionavam sobre seus futuros, num tom debochado: “E se tudo der errado?”.
A história causou muita indignação: As vestimentas nas fotos divulgadas nas mídias sociais faziam graça de profissionais de limpeza, zeladoria e atendentes de lanchonete. Tenho certeza de que não houve intenção maldosa, apenas uma iniciativa inocente.
Com sua valorização inflacionada da importância de alguns fatores (bens materiais e celebridade, por exemplo), o mundo contemporâneo tem levado os desavisados a investir na busca de algo que ainda não têm – e que, talvez, nem sequer desejaram. Qualquer coisa menor do que isso seria sinal de fracasso, humilhação, servilismo. Eis aí, uma visão míope do que é ser bem-sucedido ou “dar certo na vida”. Pior: é a receita – infalível – para a infelicidade.
“E se tudo der errado?”. Nesta especulação, tão curta, existem no mínimo três falsas premissas.
O primeiro equívoco é presumir que uma pessoa – e tudo aquilo que ela representa – possa se reduzir à sua ocupação profissional ou a uma simples relação empregatícia. Mas a verdade é bem maior do que isso. O trabalho que gera nossa renda e sustento não nos define plenamente: na vida em sociedade, estamos sempre desempenhando diversos papéis. Também somos filhos e maridos, pais e vizinhos, amigos ou colegas de trabalho, parceiros de lazer nos fins de semana. Somos, em suma, cidadãos de uma comunidade, membros de cidade, habitantes de um país – mais até, do planeta. E cada um desses relacionamentos envolve aspirações e expectativas, direitos e deveres.
Já de saída, vale lembrar que nosso primeiro papel é o de filho – e que não estreamos vestidos. Entramos nessa festa literalmente nus, totalmente despidos de rótulos e preconceitos. Aos poucos, vamos vestindo os outros adereços. E pode ser lugar comum, mas é também uma verdade clara e simples: se todos desempenhassem com um mínimo de empenho e eficiência todos os seus papéis, por certo viveríamos num mundo mais justo, equilibrado e feliz.
“Sucesso não tem a ver com o dinheiro que você ganha: tem a ver com a diferença que você faz na vida das pessoas”
MICHELLE OBAMA
Eis aqui o segundo ponto: riqueza e popularidade não definem sucesso – e os exemplos e contraexemplos são abundantes. A mídia não se cansa de mostrar como políticos corruptos, traficantes e contrabandistas conseguem amealhar fortunas – mas nem por isso podemos considerá-los pessoas bem-sucedidas.
Não é uma exclusividade de malfeitores: alguém pode garantir que Michael Jackson e George Michael tenham sido pessoas felizes – apesar de ricos e idolatrados por milhões de fãs em todo o mundo? E agora gire a luneta na direção oposta: Madre Teresa de Calcutá – canonizada em setembro do ano passado pela Igreja Católica – não possuía de seu nada além da roupa do corpo, na hora de morrer. E, ao que parece, morreu feliz.
Um executivo de sucesso teria dito à Madre Teresa de Calcutá: “Irmã, eu não faria isso que a senhora faz nem por todo o dinheiro deste mundo!”. Ao que ela respondeu: “Eu também não, meu filho... Eu também não!”
Mas voltemos ao mercado de trabalho – porque é nele que se encontra o terceiro ponto negativo da brincadeira infeliz dos desavisados jovens da nossa história: a motivação.
Um emprego é o nome genérico que damos ao trabalho remunerado em que aplicamos nossas habilidades e iniciativa com o objetivo de alcançar as metas desejadas por uma determinada empresa. É ali, na prática diária do emprego, que temos a chance de aperfeiçoar essas habilidades pessoais. É nesse ambiente que aprendemos a conviver e trabalhar com outras pessoas, a pensar no bem da equipe, da empresa e da sociedade – e é ali que, por conta de um trabalho bem feito, que aumentamos nossa autoestima, acumulamos satisfação pessoal e realização profissional.
É no desempenho do trabalho que chegamos a concretizar sonhos e atingir objetivos íntimos de vida. Já dá para ver que trabalhar numa organização – qualquer organização – é um fenômeno complexo, que envolve algumas condições individuais e circunstanciais, tais como: saber, querer e poder fazer. E é errado pensar que todos tenham a mesma motivação no trabalho. Isso envolve toda uma série de fatores intrínsecos e extrínsecos: de um lado, gostar de realizar a tarefa; de outro, as recompensas externas, como reconhecimento, salário ou status – sem falar nos chamados aspectos “transcendentais”, relativos ao impacto daquele papel ou posição sobre os demais integrantes do grupo.
“Conhece-te a ti mesmo!”: era a frase inscrita na entrada do Templo de Apolo, na Grécia Antiga – que servia de inspiração a Sócrates, o pai da filosofia. Talvez a falta desta receita antiga – o autoconhecimento – esteja na raiz de tantas frustrações e tantos temores antecipados de que nada dê certo...
O que motiva você? O que faz você feliz? Na resposta ponderada a estas perguntas, está a receita para você encontrar sua vocação – e, mais do que conseguir uma carreira, sentir-se realizado e satisfeito. Isto é dar certo na vida! Mas a resposta errada e apressada pode ser a matriz de frustrações e ressentimentos.
Se você for olhar de perto, é fácil identificar uma pessoa que trabalha por amor ao que faz. Para dar um exemplo simples e objetivo: quando paro num posto de gasolina, quero sair com o tanque cheio, no menor prazo possível. Mas é bastante diferente a experiência de ser atendido por um frentista simpático, que diz “bom dia” com um sorriso nos lábios, sabe o seu nome, limpa o para-brisa, e se despede com um “volte sempre!”. Alguém discorda?
Certamente, todo trabalho merece ser remunerado, na medida em que supre uma necessidade: alguém é beneficiado pelo serviço ou produto solicitado. Nesse sentido, todo trabalho é, por definição, necessário – e digno.
“Procure um emprego que você faria mesmo sem precisar do salário.”
WARREN BUFFET
Milionários, celebridades ou executivos de grandes empresas constituem uma parcela pequena da população. A contrapartida disso é que existem muitas e muitas pessoas com talento para (e que gostam de) ser porteiro, diarista ou atendente de lanchonete – justamente aqueles exemplos citados na brincadeira infeliz da garotada. São trabalhos dignos, necessários, que requerem talento como todos os outros – e por isso devem ser respeitados. E aplaudidos.
Graças ao trabalho de pessoas que servem ao próximo sem aquele sentimento de servilismo ou frustração de que falava o personagem do filme de Benigni, levo uma vida cercada de tranquilidade e segurança. Sou grato e aprecio o trabalho realizado pelos porteiros e seguranças do condomínio onde resido. E também os profissionais de limpeza e jardinagem que mantêm um ambiente agradável, limpo e bonito à minha volta. Gosto de ver as plantas, flores e frutas do jardim do condomínio e de minha casa. Quem não gosta disso? Em especial, sinto-me feliz de ver o carinho que minha diarista dedica ao meu lar e à minha família. Servir é uma arte. E cada um de nós, em seu trabalho, está sempre servindo aos outros.
Por isso, através da Fátima (minha diarista), Agnaldo (segurança do condomínio onde resido) e Wilson (gerente da minha lanchonete favorita), quero aqui expressar meu respeito e agradecimento a todos os profissionais que trabalham duro – e dizer a cada um deles o que eles já sabem e demonstram: eles deram certo na vida.
fonte:
Eles deram certo na vida | Marcelo Nobrega | Pulse | LinkedIn
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