Pular para o conteúdo principal

Ética e o congelamento dos embriões








Mário Saturno*

Diante dos avanços da ciência na geração de vida humana, a Igreja emitiu alguns princípios éticos para que católicos e cristãos de boa fé sigam. O documento “Instrução Dignitas Personae, Sobre Algumas Questões De Bioética” estabelece qual é a dignidade de todo ser humano, da concepção à morte natural.
As técnicas que realizam a procriação sem o ato conjugal não são consideradas lícitas para a geração da vida. Assim se enquadra a fecundação in vitro. E o mesmo vale para a chamada microinjecção intracitoplasmática ou Intracytoplasmic Sperm Injection (ICSI) que se tornou a técnica de maior eficácia para superar diversas formas de esterilidade masculina. Essas técnicas entregam a vida e a identidade do embrião ao poder dos médicos e instaura um domínio da técnica sobre a origem e o destino da pessoa humana, o que contraria a dignidade e a igualdade que devem ter pais e filhos.
E para aumentar as chances de sucesso e para não repetir as extrações dos ovócitos na mulher, procede-se a uma única extração múltipla de ovócitos, seguida da crioconservação de uma parte importante dos embriões obtidos in vitro, já prevendo uma segunda tentativa, no caso de fracasso da primeira, ou no caso dos pais quererem outra gravidez.
A crioconservação é incompatível com o respeito devido aos embriões humanos e pressupõe a sua produção in vitro, pois os expõe a graves riscos de morte ou de dano para a sua integridade física, enquanto uma alta percentagem não sobrevive às práticas de congelamento e de descongelamento. Além disso, priva aqueles embriões do acolhimento e da gestação materna e os deixa susceptíveis a posteriores ofensas e manipulações. A maioria dos embriões fica órfã.
E o que fazer com tantos embriões congelados? Muitos não têm consciência ética disso, mas outros, ao contrário, têm consciência de ter cometido uma grave injustiça. São claramente inaceitáveis as propostas de usar tais embriões para a investigação ou de destiná-los a usos terapêuticos, como se fossem simples “material biológico”. Também a proposta de descongelar estes embriões e os usar para a pesquisa como se fossem cadáveres normais, é inadmissível. Também a proposta de colocar à disposição de casais inférteis não é eticamente aceitável.
Para evitar esses graves problemas éticos, surgiu a proposta de congelar somente os ovócitos. Extraem-se os ovócitos, mas somente são fecundados os ovócitos que serão transferidos para a mãe, sendo os demais congelados para serem fecundados e transferidos no futuro. A Igreja também considera a crioconservação de ovócitos para a procriação artificial como moralmente inaceitável.
E mais abominável é a redução embrionária, ou seja, como diversos embriões são transferidos para a mãe, a gravidez múltipla pode ocorrer e isso representa risco, tendo como resultado uma intervenção cirúrgica para remover (matar) alguns fetos. Do ponto de vista ético, a redução embrionária é um aborto intencional seletivo de um ou mais seres humanos inocentes na fase inicial da sua existência e, como tal, constitui sempre uma desordem moral grave.


(*)Mario Eugenio Saturno (cienciacuriosa.blog.com) é Tecnologista Sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e congregado mariano.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

"Wokismo": uma religião universitária?

    Jean Marcel Carvalho França* É popular, e há séculos repetida com orgulho pelos seus membros, a história de que as universidades emergiram na paisagem urbana europeia, entre os séculos XI e XIV, como um espaço de liberdade e mesmo de rebeldia, um espaço em que se podia estudar, refletir e ensinar com uma certa flexibilidade, distante da rigidez e do dogmatismo do ambiente monástico, onde o conhecimento era majoritariamente produzido. O mundo, no entanto, é mudança, e quase nunca para as bandas que esperamos. A mesma instituição que surgiu sobre a égide da crítica e que, depois do iluminismo, se consolidou como o lugar do livre pensar e do combate ao tal obscurantismo, sobretudo o religioso, pariu recentemente, entre o ocaso do século XX e as décadas iniciais do XXI, uma religião tão ou mais dogmática do que aquelas que dizia combater: a religião woke . Para os interessados em conhecer mais detalhadamente a história e os dogmas desse discurso de fé que cobra contrição mas não prome

Pessoas que têm um senso de unicidade são mais felizes

Redação do Diário da Saúde As religiões têm um "ingrediente secreto" que faz pessoas felizes, mas um senso de conexão com a natureza e todos os demais seres vivos parece ter um papel ainda mais importante. [Imagem: CC0 Public Domain/Pixabay] Unicidade As pessoas que acreditam na unicidade - a ideia de que tudo no mundo está conectado e é interdependente - têm maior satisfação com a vida do que aquelas que não acreditam nessa totalidade imanente, independentemente de pertencerem a uma religião ou não. "O sentimento de estar em harmonia com um princípio divino, a vida, o mundo, outras pessoas ou mesmo atividades, tem sido discutido em várias tradições religiosas, como também em uma ampla variedade de pesquisas científicas de diferentes disciplinas. Os resultados deste estudo revelam um significativo efeito positivo das crenças unicistas sobre a satisfação com a vida, mesmo descontando as [diferenças das] crenças religiosas," disse La

Missa na UFRJ