Por Frederica Mathewes-Green [*]
Eu
sou fã de filmes antigos, aqueles em preto e branco das décadas de 1930
e 1940, em parte porque mostram o quanto a cultura americana mudou. Os
adultos desses filmes se portam de uma maneira diferente. Eles não falam
e nem andam da mesma forma que nós.
E é difícil saber qual a idade dos personagens — é como se estivessem representando uma fase da vida humana que nós perdemos.
E o que falar de Clark Gable em Terra da Paixão?
Eles possuíam o tipo de sensualidade que chamavam de “elegância”, uma
qualidade que sugere confiança e experiência. Quando o filme estreou,
Gabe tinha trinta e um anos e Harlow, vinte e um. Lembre-se também do
filme Núpcias de Escândalo.
Quando ele foi lançado, em 1940, Katherine Hepburn tinha 33 anos, Cary
Grant tinha 36, e Jimmy Stewart, 32. E eles não parecem bem mais maduros
do que os atores de hoje?
Os
personagens desses filmes antigos parecem ter uma maturidade que
ningúem possui hoje em dia. Esta não é uma observação sobre os atores
(pode ser que na vida privada, se comportassem como adolescentes). O que
está em questão é como a audiência esperava que adultos fossem
representados. Certos modos eram próprios da vida adulta, que eram muito
diferentes dos de uma criança, ou até mesmo de adolescentes, como a Judy Garland e Mickey Rooney.
Os atores de hoje preservam características hesitantes e infantis, ainda na meia-idade. Compare o Cary Grant, jovial e elegante, com o Hugh Grant,
que representava, até os 40 anos, personagens indecisos, pueris, com o
cabelo todo bagunçado. Compare a voz forte e chamativa da Bette Davis
com a vozinha nervosa da Renee Zellweger. Zellweger é adorável, mas tem
35 anos. Quando é que ela vai crescer?
Em uma crítica publicada no jornal Village Voice, sobre o filme O Aviador,
Michael Atkinson apelidou os atores infantis de que estamos falando, de
“bebezões”. “Não há como não perceber o contraste entre os atores
bebezões, com aquela carinha de bebê e voz de adolescente, e os atores
da Era de Ouro”, ele escreveu. “Embora DiCaprio tenha a mesma idade que o
Hughes tinha em 1934 (o artigo foi escrito em 2005), pode ser que ele
não convença ter 34 anos até que complete 50”. Ninguém tem mais aquele
estilo de autoridade e confiança. Nós esquecemos como se age como um
adulto.
Imagine
a geração da II Guerra Mundial, voltando para casa depois de ver tanta
agonia e sangue derramado. O mundo, por muito tempo, foi visto como um
lugar perigoso. Os pais dessa geração tinham memórias recentes da I
Guerra Mundial, e seus filhos viveram a infância rodeados pela miséria e
pela fome, por causa da Grande Depressão. E então passaram a viver num
mundo sem guerras, recém-casados, e morando em subúrbios silenciosos.
Quando olhavam para os seus bebês recém-nascidos, os sobreviventes
sentiram uma inclinação protetora poderosa. Não queriam que seus filhos
experimentassem aquilo que viveram, que não vissem coisas tão terríveis.
Acima de tudo, pretendiam proteger a inocência das crianças.
Nos
tempos em que famílias grandes viviam juntas em casas pequenas, e os
familiares doentes ou senis eram tratados em casa, e as famílias criavam
a própria comida, até mesmo as crianças conheciam as verdades da vida.
Até pouco tempo atrás, não era possível evitar que as crianças
conhecessem certos fatos. E não era desejável: a vida era difícil e
perigosa, e quanto mais cedo se aprendesse isso, mais cedo se aprenderia
a lidar com as situações da vida. Mas nas décadas de 1950 e 1960 houve
um tempo em que os pais puderam manter as crianças separadas do mundo
adulto, até que se tornassem jovens.
Essa
separação acabou, com o advento da TV à cabo e da internet. Agora, os
pais precisam aprender mais uma vez como lidar com um mundo onde
crianças podem conseguir as mesmas informações que os adultos. O que
acontece é que a lacuna entre as gerações desapareceu. Os adolescentes e
jovens de hoje assistem os mesmos filmes e ouvem as mesmas músicas que
os seus pais. O lado ruim desse fato é que muito deste material é
obsceno e grosseiro, e isso afeta a qualidade do entretenimento
infantil.
Os
pais bem intencionados da década de 1950 confundiram vulnerabilidade
com inocência moral. Eles falharam em entender que crianças que foram
sempre encorajadas a ser infantis tornariam a infantilidade em um
projeto de vida. Estes pais não estavam preparados para reagir quando
seus filhos se tornaram jovens adultos e passaram a se comportar de
forma egoísta, provocadora e hedonista.
A
geração da II Guerra Mundial via um forte contraste entre a vida adulta
e a infância: infância era pura alegria, enquanto a vida adulta era
cheia de miséria, trabalho e fadiga. O impulso resultante foi colocar as
crianças em um quartinho de brincar hermeticamente fechado. A infância,
antes entendida como uma fase de transição, se transformou quase que em
um espaço físico —
um berçário cheio de brinquedos onde as crianças poderiam brincar o dia
todo. E os pais observavam melancolicamente, desejando que seus filhos
queridos pudessem ser jovens para sempre.
Há
o ditado: cuidado com o que você deseja. Quando conservadores sentem
nostalgia das famílias da década de 1950, precisam lembrar de como as
coisas acabaram. As crianças ficaram mais velhas, mas não amadureceram.
Continuaram a demonstrar comportamentos exigentes e auto-centrados, que
se encaixava muito bem com o desejo de proteger e mimar dos pais. Eles
continuaram a acreditar que a vida seria organizada de modo a
agradá-los, como acontecia no quartinho de brincar. Eles ridicularizaram
os valores dos pais, dormiram desregradamente, e debocharam de toda
forma de autoridade.
É
claro que quando toda autoridade é destituída, o mundo não se sente
muito seguro. A ansiedade paira sobre a cultura na qual adultos agem
como crianças. Os nascidos no pós-guerra não rejeitaram apenas a vida
adulta, mas os próprios adultos. Rejeitaram os pais que se preocuparam
tanto com eles.
Com
isso, a pior perda foi o projeto de educação como foi entendido durante
a maior parte da história humana. Em culturas antigas, uma criança
ficava ao lado dos pais durante todo o dia, aprendendo a fazer tarefas
importantes para o sustento da casa. A infância acabava muito rápido.
Quando chegava aos treze ou doze anos, era considerada capaz de fazer compromissos espirituais que durariam por toda a vida —
essa era a idade tradicional para a confirmação sacramental ou para o
Bar Mitzvah. Quando já tivessem o corpo bem desenvolvido, era esperado
que trabalhassem o dia todo. A criança poderia ser considerada adulta
pouco depois disso, e já se casar no fim da adolescência. Infância era
uma rápida passagem para a vida adulta, e esta era um estado de respeito
e autoridade muito desejado.
Pense no filme Felicidade não se compra,
de 1946. Nele, a mensagem é o oposto. George Bailey sonha ser um
explorador e viajar o mundo, mas acaba deixando seus sonhos de lado para
cuidar da família. Ninguém faria um filme como esse, atualmente. Em uma
versão atual, George Bailey brigaria com o pai, fugiria de casa rumo a
um navio para viajar o mundo, viveria aventuras perigosas e excitantes, e
então voltaria para casa para uma grande festa. Seu pai, então, lhe
diria com lágrimas nos olhos: “Você estava certo, meu filho.”
Este
tipo de sucesso não acontece muitas vezes. Apesar de todo o
encorajamento para as crianças seguirem seus sonhos, os Boomers criaram
seus filhos com base na cautela e aversão ao risco. Gen-Xers gastam
suas primeiras décadas, até a graduação, sendo observados de perto por
pessoas gentis que, prestativamente, reconhecem ou criticam seus
esforços. Um artigo da revista Time, de janeiro de 2005, revelou que 48% dos que estão na segunda década de vida ligam ou mandam e-mail para os pais todos os dias.
Estes
anos de educação escolar prolongada constituem uma vida doce, mas tudo
muda bruscamente quando o graduado sai para a rua. De repente, a criança
que foi criada com flexibilidade infinita deve enfrentar um emprego com
horários, vestir-se conforme o esperado, fazer intervalos apenas em
horários determinados, e levantar-se no dia seguinte para fazer tudo de
novo. A vida depois da escola tem regras inflexíveis, e as crianças que
foram criadas com flexibilidade sem limites são esmagadas por ela.
No livro Quarterlife Crisis,
Alexandra Robbins e Abby Wilner descrevem quão confusa é esta surpresa.
Eles citam uma jovem que tornou-se Mestre em performance de flauta,
pela academia; e então descobriu que possuir esta habilidade não lhe
garantia um emprego. Você pode imaginar quantos professores e
orientadores a ouviram com os olhos a brilhar, dizendo-lhe repetidamente
que ela poderia fazer o que bem entendesse. Não é culpa dela ter
acreditado. Os Boomers têm preparado seus filhos para uma vida que não existe.
As
expectativas dos pais podem congelar as crianças durante a caminhada.
Até mesmo a ordem “siga seus sonhos” pode imobilizar, se você não tiver
certeza de quais são seus sonhos, e nada do que vem à mente pareça
urgente. Não é de se surpreender que as pessoas que estão com vinte e
poucos anos não consigam manter o foco, são inseguras e têm medo de
errar. Eles voltam para casa depois da faculdade e vivem mudando de
emprego.
Então
o que devemos fazer? Como podemos recuperar uma visão positiva da vida
adulta e preparar as futuras gerações para enfrentá-la? Este problema
tem muitas partes. A que mais me interessa é a data dos casamentos, que
acontecem cada vez mais tarde. A média dos casamentos atuais acontece
entre um homem de 27 anos, e uma mulher de 25. Me intriga a anormalidade
patente deste dado. Deus projetou nossos corpos para que desejassem
companhia bem mais cedo, e durante maior parte da história, a sociedade
assimilou esse desejo permitindo as pessoas a se casarem no fim da
adolescência, ou pouco depois de completarem 20 anos. As pessoas só
adiariam o casamento em casos de desastre econômico ou escassez de
comida.
Pessoas
jovens não são tão imaturas para o casamento, a menos que lhes digamos
que são. Cinquenta anos atrás, quando as noivas tinham, em média, vinte
anos, a taxa de divórcio era metade do que é agora, porque a cultura
encorajava o sustento do casamento. Mas se nós dizemos aos jovens que
eles são naturalmente incapazes de fazer um casamento funcionar, eles
com certeza atenderão às nossas expectativas. Na verdade, eu tenho uma
teoria de que o casamento tardio contribui com o aumento da taxa de
divórcio.
Durante
os anos prolongados de solteiro na vida adulta, apesar de os jovens não
se casarem, eles continuam se apaixonando. Eles se apaixonam, terminam,
sofrem, e descobrem que com o tempo isso passa. Isso é verdade, mesmo
que eles permaneçam castos. No tempo em que esses jovens se casarem,
pode ser que tenham tido diversas oportunidades para aprender como se
esquivar de uma promessa. Um treino para o divórcio.
O
casamento tardio é uma luta contra o desígnio dos nossos corpos, e esta
é uma luta que não se pode vencer. No filme indicado ao Oscar, Entre umas e outras,
um ator de televisão de 40 anos está prestes a se casar. Ele embarca
numa viagem de despedida de solteiro de uma semana com seu amigo Miles, e
logo se afunda numa profundidade que surpreende até mesmo o Miles.
Enquanto Jack defende um ato desprezível, ele diz: “Eu sei que você não
aprova o que eu estou fazendo. E eu respeito isso. mas existem coisas
que tenho de fazer, que você não entende.”
Historiadores do futuro terão que adivinhar o que queriamos fazer —
como uma geração inteira se esqueceu de crescer, enquanto tentavam
criar uma geração mais nova e liderar a nação mais poderosa do mundo
durante tempos de guerra e terror. As habilidades da vida adulta nos são
estranhas, não sabemos mais usá-las. Reunir a gravidade e a confiança
que confirmam a maturidade está além das nossas capacidades. Não foi a
juventude que nos deixou, mas a maturidade.
[*] Frederica Mathewes-Green. “Against Eternal Youth”. First Things, 1 de Agosto de 2005.
Tradução: Laan Carvalho
Revisão: Rodrigo Carmo
Contra a juventude eterna – Tradutores de Direita
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