Há
poucos dias foi noticiado que o Conselho da Magistratura do TJ/RS, em
decisão unânime, acatou pedido da Liga Brasileira de Lésbicas e de
outras entidades sociais sobre a retirada dos crucifixos e símbolos
religiosos nos espaços públicos dos prédios da Justiça gaúcha[1].
E prosseguia a notícia: Disse o magistrado que resguardar o espaço
público do Judiciário para o uso somente de símbolos oficiais do Estado é
o único caminho que responde aos princípios constitucionais
republicanos de um Estado laico, devendo ser vedada a manutenção dos
crucifixos e outros símbolos religiosos em ambientes públicos dos
prédios.
A decisão acima citada, segundo entendemos, subverteu o
conceito de Estado Laico e mais particularmente do Estado brasileiro,
como delineado pela Constituição Federal de 1988.
Como é de sabença trivial, Estado laico, secular ou não confessional
é aquele que não adota uma religião oficial e no qual há separação
entre o Clero e o Estado, de modo que não haja envolvimento entre os
assuntos de um e de outro, muito menos sujeição do segundo ao primeiro.
Portanto, de plano se verifica que Estado laico não é sinônimo de Estado
antirreligioso.
Antes de prosseguir, convém repisar a diferença entre dois conceitos: laicidade e laicismo.
De modo bastante sucinto, a laicidade é característica dos Estados não confessionais que assumem uma posição de neutralidade perante a religião, a qual se traduz em respeito
por todos os credos e inclusive pela ausência deles (agnosticismo,
ateísmo). Já o laicismo, igualmente não confessional, refere-se aos
Estados que assumem uma postura de tolerância ou de intolerância religiosa, ou seja, a religião é vista de forma negativa, ao contrário do que se passa com a laicidade.
A
Constituição Federal de 1988, como de resto a maioria das anteriores,
não permite nem mesmo que se cogite ou suspeite de laicismo no Estado
brasileiro. Com efeito, qualquer ideia de laicismo é repudiada ab ovo,
pois já no preâmbulo de nossa Carta é solenemente declarado:
“promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da
República Federativa do Brasil” (g.n.). Obviamente, um Estado que se
constitui sob a proteção de Deus pode ser tudo, menos um Estado ateu ou antirreligioso.
Decerto,
porém, que o apreço e o reconhecimento dos valores religiosos não
ficaram somente no preâmbulo. Longe disso, a Constituição de 1988 foi
bastante zelosa ao dispor sobre estes valores. Confira-se:
Art. 5º ...
(...)
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma
da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é
assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas
entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII -
ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação
alternativa, fixada em lei;
Art. 143. O serviço militar é obrigatório nos termos da lei.
§
1º - às Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço
alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem
imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença
religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de
atividades de caráter essencialmente militar.
§ 2º - As mulheres e
os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempo
de paz, sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir.
Art. 150.
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...) VI - instituir impostos sobre:
(...) b) templos de qualquer culto;
Art. 210. ...
§
1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental.
Art. 226. ...
(...) § 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.»
E
o apreço é tal pela religião que até o art. 19, que define a laicidade
de nosso Estado, não deixa de conferir garantias religiosas:
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I
- estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los,
embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes
relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a
colaboração de interesse público; (g.n.)
Note-se que as vedações
deste art. 19 são claríssimas: não estabelecer cultos religiosos nem
igrejas, não subvencioná-los e não manter com eles ou seus
representantes relações de dependência ou aliança. É certo que este
dispositivo deve ser interpretado taxativamente, pois se trata de norma
restritiva. Assim sendo, surge naturalmente a pergunta: de que forma um crucifixo na parede incorreria em alguma das vedações do art. 19, inc. I da Constituição Federal?
A resposta é óbvia: de forma nenhuma. E se não incorre nas citadas
vedações não há nada que justifique sua proibição. Acreditamos que esta
razão baste para demonstrar o equívoco da decisão gaúcha, mas há mais.
Partindo de outro enfoque, abstraindo a conclusão do parágrafo anterior, podemos ir direto ao ponto e indagar: a existência de algum símbolo religioso em prédio público macula a laicidade do Estado brasileiro?
A
resposta nos parece de uma clareza solar, podendo ser facilmente
encontrada a partir de outras singelas indagações, com base nos
dispositivos constitucionais acima transcritos. Algo assim: o fato de o Estado ...
a)
assegurar o livre exercício dos cultos religiosos e garantir a proteção
aos locais de culto e a suas liturgias, fere a laicidade do Estado?
b)
assegurar a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e
militares de internação coletiva, fere a laicidade do Estado?
c)
permitir que alguém oponha validamente sua crença religiosa ao
cumprimento de obrigação legal a todos imposta, mediante prestação
alternativa, fere a laicidade do Estado?
d) eximir do
serviço militar obrigatório, mediante serviço alternativo, quem alegar
imperativo de consciência decorrente de crença religiosa, fere a
laicidade do Estado?
e) isentar do mesmo serviço obrigatório os eclesiásticos, compromete a laicidade do Estado?
f) conceder imunidade de impostos aos templos de qualquer culto, não fere a laicidade do Estado?
g) prever o ensino religioso facultativo como disciplina dos horários normais das escolas compromete a laicidade do Estado?
h) conferir efeito civil ao casamento religioso, na forma da lei, não fere seu caráter laical?
i) impor a si mesmo a proibição de embaraçar os cultos religiosos, não compromete seu caráter laico?
A
resposta a todas as indagações acima é necessariamente negativa, pois o
contrário corresponderia à negação do Estado laico, e sem esta premissa
não subsistiria a presente questão.
A próxima pergunta, então, é
óbvia e certamente já está na mente do leitor: se nada disso compromete o
caráter laico do Estado, pois tudo está previsto na Constituição, como
seria possível que algo muito mais singelo, como um simples crucifixo na
parede, pudesse malferir a laicidade do Estado?
Com todas as
vênias, nos parece absurdo supor que a mesma Constituição que abre mão
de cifras milionárias com a concessão de imunidade aos templos de qualquer culto (templo
este que é considerado em sentido lato pela jurisprudência), e que se
desdobra para tutelar os valores religiosos, conforme visto nos
dispositivos acima transcritos, possa proibir, implicitamente(!), a
permanência de símbolos religiosos que tradicionalmente se encontram em
alguns prédios públicos.
Com efeito, quem pode o mais, pode o menos, não há como fugir deste truísmo. Assim, se a Constituição admite o mais no campo religioso, sem que se possa considerar o Estado menos laico por conta disso, é evidente que também admite o menos (o crucifixo na parede).
Outro ponto que muito nos preocupa neste tema – e que vem se tornando lamentavelmente comum – é a utilização repetitiva de sofismas.
Trata-se de afirmações vazias que procuram transformar o absurdo em
lógica, é o caso noticiado do Conselho da Magistratura gaúcha, segundo o
qual “resguardar o espaço público do Judiciário para o uso somente de
símbolos oficiais do Estado é o único caminho que responde aos
princípios constitucionais republicanos de um Estado laico, devendo ser
vedada a manutenção dos crucifixos e outros símbolos religiosos em
ambientes públicos dos prédios”.
Ora, nada mais equivocado. Nada
além de uma frase bonita, mas sem conteúdo: resguardar do quê? De algo
vedado pela Constituição? Já se viu que não. Único caminho para onde,
para quê? Para a intolerância. Ao contrário do afirmado pelo referido
Conselho, acreditamos que o que responde aos princípios constitucionais
republicanos de um Estado laico se chama respeito, e compreensão
acerca da herança cultural e religiosa de um país. Portanto, a presença
de um símbolo religioso numa repartição pública, só por si, não tem o
condão de nem mesmo arranhar a laicidade do Estado.
Argumenta-se
ainda (incansavelmente), que os símbolos são cristãos e nem todos o são,
daí a inconstitucionalidade. Este tipo de argumento traz à memória um
fato noticiado há algum tempo, uma pós-adolescente, mulher de um jogador
de futebol, se negara a entrar no carro de sua mãe por haver nele uma
pequena imagem religiosa, doutra fé que não a da garota. Ou seja, intolerância religiosa
pura. E não é nada além desse tipo de intolerância que o Judiciário
tutela quando determina a retirada de objetos religiosos tradicionais
das repartições públicas, sob a alegação de estar agindo em defesa da
laicidade ou de qualquer outro princípio republicano.
Não se perca
de vista que o Brasil é um país eminentemente cristão, logo, qual o
tipo de imagem religiosa que se supõe encontrar disseminada? Haveria aí
alguma concessão do Estado em prol de uma religião e em detrimento das
outras? De modo algum, pois ou tais imagens estão por tradição nos
referidos prédios, algumas há séculos, ou são miudezas carreadas pela fé
e tradição dos que laboram no local, nada além.
E o não-cristão? E
o ateu e o agnóstico? Como ‘ficam’? Esses não terão sua esfera jurídica
atingida em absolutamente nada, pois, se não forem cristãos, basta
ignorar o crucifixo ou considerá-lo como um penduricalho na parede. Ou
assim ou teremos um Judiciário que premia a intolerância e se vocaciona
ao acolhimento das pretensões mais mesquinhas que insistem em acompanhar
a humanidade através dos séculos.
[1] http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI151274,21048-Determinada+a+retirada+dos+crucifixos+dos+predios+da+Justica+gaucha
fonte:
poucos dias foi noticiado que o Conselho da Magistratura do TJ/RS, em
decisão unânime, acatou pedido da Liga Brasileira de Lésbicas e de
outras entidades sociais sobre a retirada dos crucifixos e símbolos
religiosos nos espaços públicos dos prédios da Justiça gaúcha[1].
E prosseguia a notícia: Disse o magistrado que resguardar o espaço
público do Judiciário para o uso somente de símbolos oficiais do Estado é
o único caminho que responde aos princípios constitucionais
republicanos de um Estado laico, devendo ser vedada a manutenção dos
crucifixos e outros símbolos religiosos em ambientes públicos dos
prédios.
A decisão acima citada, segundo entendemos, subverteu o
conceito de Estado Laico e mais particularmente do Estado brasileiro,
como delineado pela Constituição Federal de 1988.
Como é de sabença trivial, Estado laico, secular ou não confessional
é aquele que não adota uma religião oficial e no qual há separação
entre o Clero e o Estado, de modo que não haja envolvimento entre os
assuntos de um e de outro, muito menos sujeição do segundo ao primeiro.
Portanto, de plano se verifica que Estado laico não é sinônimo de Estado
antirreligioso.
Antes de prosseguir, convém repisar a diferença entre dois conceitos: laicidade e laicismo.
De modo bastante sucinto, a laicidade é característica dos Estados não confessionais que assumem uma posição de neutralidade perante a religião, a qual se traduz em respeito
por todos os credos e inclusive pela ausência deles (agnosticismo,
ateísmo). Já o laicismo, igualmente não confessional, refere-se aos
Estados que assumem uma postura de tolerância ou de intolerância religiosa, ou seja, a religião é vista de forma negativa, ao contrário do que se passa com a laicidade.
A
Constituição Federal de 1988, como de resto a maioria das anteriores,
não permite nem mesmo que se cogite ou suspeite de laicismo no Estado
brasileiro. Com efeito, qualquer ideia de laicismo é repudiada ab ovo,
pois já no preâmbulo de nossa Carta é solenemente declarado:
“promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da
República Federativa do Brasil” (g.n.). Obviamente, um Estado que se
constitui sob a proteção de Deus pode ser tudo, menos um Estado ateu ou antirreligioso.
Decerto,
porém, que o apreço e o reconhecimento dos valores religiosos não
ficaram somente no preâmbulo. Longe disso, a Constituição de 1988 foi
bastante zelosa ao dispor sobre estes valores. Confira-se:
Art. 5º ...
(...)
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma
da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é
assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas
entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII -
ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação
alternativa, fixada em lei;
Art. 143. O serviço militar é obrigatório nos termos da lei.
§
1º - às Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço
alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem
imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença
religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de
atividades de caráter essencialmente militar.
§ 2º - As mulheres e
os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempo
de paz, sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir.
Art. 150.
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...) VI - instituir impostos sobre:
(...) b) templos de qualquer culto;
Art. 210. ...
§
1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental.
Art. 226. ...
(...) § 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.»
E
o apreço é tal pela religião que até o art. 19, que define a laicidade
de nosso Estado, não deixa de conferir garantias religiosas:
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I
- estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los,
embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes
relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a
colaboração de interesse público; (g.n.)
Note-se que as vedações
deste art. 19 são claríssimas: não estabelecer cultos religiosos nem
igrejas, não subvencioná-los e não manter com eles ou seus
representantes relações de dependência ou aliança. É certo que este
dispositivo deve ser interpretado taxativamente, pois se trata de norma
restritiva. Assim sendo, surge naturalmente a pergunta: de que forma um crucifixo na parede incorreria em alguma das vedações do art. 19, inc. I da Constituição Federal?
A resposta é óbvia: de forma nenhuma. E se não incorre nas citadas
vedações não há nada que justifique sua proibição. Acreditamos que esta
razão baste para demonstrar o equívoco da decisão gaúcha, mas há mais.
Partindo de outro enfoque, abstraindo a conclusão do parágrafo anterior, podemos ir direto ao ponto e indagar: a existência de algum símbolo religioso em prédio público macula a laicidade do Estado brasileiro?
A
resposta nos parece de uma clareza solar, podendo ser facilmente
encontrada a partir de outras singelas indagações, com base nos
dispositivos constitucionais acima transcritos. Algo assim: o fato de o Estado ...
a)
assegurar o livre exercício dos cultos religiosos e garantir a proteção
aos locais de culto e a suas liturgias, fere a laicidade do Estado?
b)
assegurar a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e
militares de internação coletiva, fere a laicidade do Estado?
c)
permitir que alguém oponha validamente sua crença religiosa ao
cumprimento de obrigação legal a todos imposta, mediante prestação
alternativa, fere a laicidade do Estado?
d) eximir do
serviço militar obrigatório, mediante serviço alternativo, quem alegar
imperativo de consciência decorrente de crença religiosa, fere a
laicidade do Estado?
e) isentar do mesmo serviço obrigatório os eclesiásticos, compromete a laicidade do Estado?
f) conceder imunidade de impostos aos templos de qualquer culto, não fere a laicidade do Estado?
g) prever o ensino religioso facultativo como disciplina dos horários normais das escolas compromete a laicidade do Estado?
h) conferir efeito civil ao casamento religioso, na forma da lei, não fere seu caráter laical?
i) impor a si mesmo a proibição de embaraçar os cultos religiosos, não compromete seu caráter laico?
A
resposta a todas as indagações acima é necessariamente negativa, pois o
contrário corresponderia à negação do Estado laico, e sem esta premissa
não subsistiria a presente questão.
A próxima pergunta, então, é
óbvia e certamente já está na mente do leitor: se nada disso compromete o
caráter laico do Estado, pois tudo está previsto na Constituição, como
seria possível que algo muito mais singelo, como um simples crucifixo na
parede, pudesse malferir a laicidade do Estado?
Com todas as
vênias, nos parece absurdo supor que a mesma Constituição que abre mão
de cifras milionárias com a concessão de imunidade aos templos de qualquer culto (templo
este que é considerado em sentido lato pela jurisprudência), e que se
desdobra para tutelar os valores religiosos, conforme visto nos
dispositivos acima transcritos, possa proibir, implicitamente(!), a
permanência de símbolos religiosos que tradicionalmente se encontram em
alguns prédios públicos.
Com efeito, quem pode o mais, pode o menos, não há como fugir deste truísmo. Assim, se a Constituição admite o mais no campo religioso, sem que se possa considerar o Estado menos laico por conta disso, é evidente que também admite o menos (o crucifixo na parede).
Outro ponto que muito nos preocupa neste tema – e que vem se tornando lamentavelmente comum – é a utilização repetitiva de sofismas.
Trata-se de afirmações vazias que procuram transformar o absurdo em
lógica, é o caso noticiado do Conselho da Magistratura gaúcha, segundo o
qual “resguardar o espaço público do Judiciário para o uso somente de
símbolos oficiais do Estado é o único caminho que responde aos
princípios constitucionais republicanos de um Estado laico, devendo ser
vedada a manutenção dos crucifixos e outros símbolos religiosos em
ambientes públicos dos prédios”.
Ora, nada mais equivocado. Nada
além de uma frase bonita, mas sem conteúdo: resguardar do quê? De algo
vedado pela Constituição? Já se viu que não. Único caminho para onde,
para quê? Para a intolerância. Ao contrário do afirmado pelo referido
Conselho, acreditamos que o que responde aos princípios constitucionais
republicanos de um Estado laico se chama respeito, e compreensão
acerca da herança cultural e religiosa de um país. Portanto, a presença
de um símbolo religioso numa repartição pública, só por si, não tem o
condão de nem mesmo arranhar a laicidade do Estado.
Argumenta-se
ainda (incansavelmente), que os símbolos são cristãos e nem todos o são,
daí a inconstitucionalidade. Este tipo de argumento traz à memória um
fato noticiado há algum tempo, uma pós-adolescente, mulher de um jogador
de futebol, se negara a entrar no carro de sua mãe por haver nele uma
pequena imagem religiosa, doutra fé que não a da garota. Ou seja, intolerância religiosa
pura. E não é nada além desse tipo de intolerância que o Judiciário
tutela quando determina a retirada de objetos religiosos tradicionais
das repartições públicas, sob a alegação de estar agindo em defesa da
laicidade ou de qualquer outro princípio republicano.
Não se perca
de vista que o Brasil é um país eminentemente cristão, logo, qual o
tipo de imagem religiosa que se supõe encontrar disseminada? Haveria aí
alguma concessão do Estado em prol de uma religião e em detrimento das
outras? De modo algum, pois ou tais imagens estão por tradição nos
referidos prédios, algumas há séculos, ou são miudezas carreadas pela fé
e tradição dos que laboram no local, nada além.
E o não-cristão? E
o ateu e o agnóstico? Como ‘ficam’? Esses não terão sua esfera jurídica
atingida em absolutamente nada, pois, se não forem cristãos, basta
ignorar o crucifixo ou considerá-lo como um penduricalho na parede. Ou
assim ou teremos um Judiciário que premia a intolerância e se vocaciona
ao acolhimento das pretensões mais mesquinhas que insistem em acompanhar
a humanidade através dos séculos.
[1] http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI151274,21048-Determinada+a+retirada+dos+crucifixos+dos+predios+da+Justica+gaucha
fonte:
ConJur - Estado laico não é sinônimo de Estado antirreligioso ou laicista
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