Percival Puggina
Chico Buarque ocupou durante algum tempo funções privilegiadas na minha
geração. Namoramos ao som de Chico. Amamos com Chico. Dançamos Chico.
Mal, mas dançamos. Chico enternecia corações, a virtude trepidava, a
gente era feliz. E sabia. Éramos sócios remidos no clube da eterna
juventude e bebíamos cada lágrima nos olhos tristes de Carolina. Quantas
vezes passei braço nos ombros de Pedro Pedreiro e caminhei com ele,
penseiro das mesmas divagações! Há um enorme repertório, produzido por
seu talento poético e musical que, a cada reprodução, me arrasta pelos
pés se for preciso à minha juventude e à Porto Alegre dos anos 70.
Foi nessa época, também, que se tornou conhecido o engajamento político
de Chico e seu alinhamento com o partidão (PCB). Para ele e para muitos
outros, foram tempos de interditos e censuras que tinham, cá entre nós,
a marca do mau gosto. E de um inexplicável medo da música. Medo da
música? Quem pode ter medo da música? Parodiando Stalin - quantas
divisões tem um compositor que não sejam as dos compassos de sua canção?
E a música de Chico, convenhamos, nunca produziu frêmitos
revolucionários. Não, censurar Chico e tantos outros foi um erro. Mas
não é essa a minha pauta. Quero falar do Chico engajado, sempre pronto a
assinar qualquer mensagem de apoio ao comunismo e ao regime cubano.
Resistiu e resiste até a última vilania dos ditadores vermelhos. Aquilo
que nem Saramago suportou, a execução dos três negritos e a prisão de 75
periodistas e intelectuais independentes, ele engoliu com bom uísque e
foi em frente. Ante o que levou Rigoberta Menchú à deserção, Chico deu
de ombros. A mais do que cinquentenária ditadura castrista continua a
lhe merecer incondicional reverência.
A polêmica disputa
jurídico-legislativa entre o grupo Procure Saber (formado por
celebridades musicais como Chico, Caetano, Milton Nascimento, Djavan,
Erasmo e Gil) e a Associação Nacional de Editores de livros reabre a
discussão sobre o direito de escrever e o direito de não ser objeto da
escrita alheia. E aí, queiram ou não os membros do Grupo Saber, entra a
questão da censura, muito mal vista por todos enquanto estiveram sob seu
infausto escrutínio. Não há como desfrutar, simultaneamente, as
vantagens da celebridade e os benefícios do anonimato.
***
Berthold Brecht, com brutal franqueza, ensinava que a solitária virtude
de quem luta pelo comunismo é a luta pelo comunismo. Quaisquer outras
às quais nós conservadores ainda tentamos, aqui e ali, atribuir algum
valor são irrelevantes para Brecht. Pois bem, o objetivo final do
comunismo é a eliminação da propriedade privada. O Manifesto Comunista
deixa muito claro o que Marx e Engels pensavam sobre a posse individual
de bens (que segundo eles só era viável para alguns por não ser possível
para todos). Dirigindo-se à sociedade burguesa, afirmaram no Manifesto:
"Em resumo, acusai-nos de querer abolir vossa propriedade. De fato é
isso que queremos". Tal é o generoso projeto marxista ao qual Chico
Buarque adere.
No entanto, direito autoral é uma legítima
forma de propriedade. Tão propriedade quanto qualquer outra. Não
deveriam os comunistas dar o exemplo, renunciando a seus direitos
autorais? Ou estimulando sua desapropriação para, por exemplo, prover
fundos ao Retiro dos Artistas, em suas tantas carências? O comunismo é
uma ideia generosa e pródiga. Com os bens alheios.
Percival Puggina
Foi nessa época, também, que se tornou conhecido o engajamento político de Chico e seu alinhamento com o partidão (PCB). Para ele e para muitos outros, foram tempos de interditos e censuras que tinham, cá entre nós, a marca do mau gosto. E de um inexplicável medo da música. Medo da música? Quem pode ter medo da música? Parodiando Stalin - quantas divisões tem um compositor que não sejam as dos compassos de sua canção? E a música de Chico, convenhamos, nunca produziu frêmitos revolucionários. Não, censurar Chico e tantos outros foi um erro. Mas não é essa a minha pauta. Quero falar do Chico engajado, sempre pronto a assinar qualquer mensagem de apoio ao comunismo e ao regime cubano. Resistiu e resiste até a última vilania dos ditadores vermelhos. Aquilo que nem Saramago suportou, a execução dos três negritos e a prisão de 75 periodistas e intelectuais independentes, ele engoliu com bom uísque e foi em frente. Ante o que levou Rigoberta Menchú à deserção, Chico deu de ombros. A mais do que cinquentenária ditadura castrista continua a lhe merecer incondicional reverência.
A polêmica disputa jurídico-legislativa entre o grupo Procure Saber (formado por celebridades musicais como Chico, Caetano, Milton Nascimento, Djavan, Erasmo e Gil) e a Associação Nacional de Editores de livros reabre a discussão sobre o direito de escrever e o direito de não ser objeto da escrita alheia. E aí, queiram ou não os membros do Grupo Saber, entra a questão da censura, muito mal vista por todos enquanto estiveram sob seu infausto escrutínio. Não há como desfrutar, simultaneamente, as vantagens da celebridade e os benefícios do anonimato.
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Berthold Brecht, com brutal franqueza, ensinava que a solitária virtude de quem luta pelo comunismo é a luta pelo comunismo. Quaisquer outras às quais nós conservadores ainda tentamos, aqui e ali, atribuir algum valor são irrelevantes para Brecht. Pois bem, o objetivo final do comunismo é a eliminação da propriedade privada. O Manifesto Comunista deixa muito claro o que Marx e Engels pensavam sobre a posse individual de bens (que segundo eles só era viável para alguns por não ser possível para todos). Dirigindo-se à sociedade burguesa, afirmaram no Manifesto: "Em resumo, acusai-nos de querer abolir vossa propriedade. De fato é isso que queremos". Tal é o generoso projeto marxista ao qual Chico Buarque adere.
No entanto, direito autoral é uma legítima forma de propriedade. Tão propriedade quanto qualquer outra. Não deveriam os comunistas dar o exemplo, renunciando a seus direitos autorais? Ou estimulando sua desapropriação para, por exemplo, prover fundos ao Retiro dos Artistas, em suas tantas carências? O comunismo é uma ideia generosa e pródiga. Com os bens alheios.
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