Um padre tonto é tratado pela imprensa como se fosse um misto de Voltaire com Santo Agostinho. Ou: O sacerdote que decidiu dar um ultimato à Igreja: ou ela muda, ou ele não volta!
Ai,
ai… É tanta bobagem que a gente mal sabe por onde começar. Em Bauru, há
um padre chamado Roberto Francisco Daniel. Tem programa de rádio,
costuma postar vídeos na Internet, usa piercing e anéis, exibe camisetas
com estampas que remetem ao rock ou com a imagem de Che Guevara (o
porco fedorento e assassino) e frequenta choperias. Fiquei sabendo de
tudo isso lendo uma reportagem na Folha. O padre tem ideias muito próprias sobre uma porção de coisas:
- defende o amor entre pessoas do mesmo sexo;
– acha que maridos podem se apaixonar por homens, e as mulheres casadas, por mulheres. E podem viver esse amor sem problemas desde que não haja traição. Todo mundo tem de saber de tudo. A reportagem não diz, mas suponho que ele admita até a possibilidade de homens casados se apaixonarem por outras mulheres, e vice-versa… Não sei se entendem a sutileza.
– a reportagem informa que ele tem uma “legião” de seguidores. Descontraído, claro!, é conhecido como “Padre Beto”.
– acha que maridos podem se apaixonar por homens, e as mulheres casadas, por mulheres. E podem viver esse amor sem problemas desde que não haja traição. Todo mundo tem de saber de tudo. A reportagem não diz, mas suponho que ele admita até a possibilidade de homens casados se apaixonarem por outras mulheres, e vice-versa… Não sei se entendem a sutileza.
– a reportagem informa que ele tem uma “legião” de seguidores. Descontraído, claro!, é conhecido como “Padre Beto”.
O primeiro parágrafo da reportagem da Folha é, como posso dizer?, teologicamente impagável. Reproduzo e comento.
“Conhecido
por contestar os princípios morais conservadores da Igreja Católica, um
padre de Bauru (329 km de SP) que havia sido formalmente repreendido
pelo bispo local anunciou neste sábado que irá se afastar de suas
funções religiosas.”
Comento
Veja vem, leitor: os “princípios morais” da Igreja Católica só podem ser considerados “conservadores” ou “progressistas” no cotejo com os princípios morais de outros grupos, certo? Caso sejam comparados com o islamismo xiita, por exemplo, serão considerados, não tenho dúvida, progressistas. Caso os dos xiitas sejam confrontados com os dos wahabitas, aí o xiismo é que vai parecer avançadinho… Imaginem só: no Irã, uma mulher pode dirigir, dar aula em universidade, participar do Parlamento. Na Arábia Saudita, nem pensar.
Veja vem, leitor: os “princípios morais” da Igreja Católica só podem ser considerados “conservadores” ou “progressistas” no cotejo com os princípios morais de outros grupos, certo? Caso sejam comparados com o islamismo xiita, por exemplo, serão considerados, não tenho dúvida, progressistas. Caso os dos xiitas sejam confrontados com os dos wahabitas, aí o xiismo é que vai parecer avançadinho… Imaginem só: no Irã, uma mulher pode dirigir, dar aula em universidade, participar do Parlamento. Na Arábia Saudita, nem pensar.
Assim,
seria o caso de indagar: o que quer dizer “princípios morais
conservadores da Igreja Católica”? Conservadores em relação a quê?
Certamente a repórter tem como valor de referência a moral laica, não
religiosa, agnóstica quem sabe, ateia no limite. E todos esses valores,
obviamente, são legítimos para quem os cultiva.
Muito bem!
O chato do Irã ou da Arábia Saudista é que não sobra espaço para ser
cristão, ateu ou macumbeiro. Não é raro que a acusação de apostasia
renda pena de morte. No Ocidente, não! No catolicismo, não! As pessoas
são livres para escolher o que as faz felizes. E ponto final.
Quando o
tal padre Beto decidiu pertencer à Igreja Católica, ser seu sacerdote,
ele não ignorava os princípios que orientam a instituição. Poderia ter
dito: “Ah, não, isso é conservador demais pra mim”. E que fosse fazer
outra coisa, que tivesse encontrado outra religião, ora essa! Se eu
convidá-lo, leitor, para tomar um café em casa e disser que só entra lá
quem estiver com uma camiseta do Corinthians, você tem duas opções, e a
terceira é inimaginável: a) aceitar o meu convite e comparecer com a camiseta do Corinthians; b) recusar o meu convite. Não existe a alternativa c:
negar-se a envergar a camiseta do timão e ficar fazendo comício na
porta da minha casa, exigindo o seu “direito” de entrar em nome da
“liberdade de expressão” ou da “liberdade de camiseta”.
A Igreja é
“Católica” — e isso quer dizer “universal” —, pretende ser de todos os
homens, mas é evidente que é uma religião de uma parcela da humanidade
apenas — algo em torno de 18%. Já há muito tempo, só se impõe e se
espalha pelo convencimento, pela caridade, pelo trabalho social, tudo
isso ancorado nos Evangelhos. No mundo livre, as pessoas escolhem ser
católicas ou qualquer outra coisa; em muitas ditaduras, essa escolha
pode resultar em punição e morte.
O tal
“padre Beto”, tratado pela reportagem da Folha como um pensador
iluminista — para ser Voltaire, visivelmente, faltam-lhe nariz e muita
filosofia —, não é um pensador desassombrado. É só um tolo, que decidiu
usar o púlpito para pregar uma religião que católica não é. E, por isso,
foi repreendido pelo bispo. Como não aceitou a admoestação, decidiu se
afastar.
Que bom!
Melhor para a Igreja e certamente melhor para si mesmo. Ele tem o
direito de pensar o que bem entender. Mas não tem o direito, não como
padre, de dizer coisas como esta:
“Se
refletir é um pecado, sempre fui e sempre serei um pecador. Quem disse
que um dogma não pode ser discutido? Não consigo ser padre numa
instituição que no momento não respeita a liberdade de expressão e
reflexão”.
É um
apanhado de tolices, que parece limonada gelada em dia quente e seco
para a ignorância filosófica e teológica que grassa na imprensa. Quem
disse que “refletir é pecado”? A Igreja? Perguntem a Santo Agostinho ou a
Santo Tomás de Aquino. Beto é estúpido! Lida mal com as palavras. Se um
dogma, como ele diz, pode ser discutido, então se deve admitir no seio
da Igreja Católica quem não acredita na própria Igreja como obra do
Cristo ou quem despreza o sacrifício da Cruz. Como? Ele não consegue ser
padre de uma “instituição que não respeita a liberdade de expressão e
reflexão”? Deixem-me ver se entendi: padre Beto gostaria de ser padre
renegando alguns dos fundamentos que tornam Beto… um padre!
É de um
cretinismo fabuloso! Isso não é padre já há muito! Tudo indica, pelo
cheiro da brilhantina, que a Diocese sabe há muito tempo que ele “ora
por fora”. É de se lamentar que tenha chegado tão longe se dizendo um
“padre”. Outro trecho da reportagem seria de rolar de rir não fosse a
expressão cruel desses dias:
“O padre
não descarta a possibilidade de voltar, desde que a Igreja fique mais
progressista. Afirmou que vai manter o celibato e poderá encontrar seus
seguidores para reuniões de orações, sem que isso signifique a criação
de uma nova religião.”
Heeeinnn?
Quer dizer que ele até pode voltar desde que a Igreja Católica mude?
Entenderam quem é Beto? Ele jamais mudaria, está claro, para se adequar
aos valores da Igreja da qual decidiu ser sacerdote. Mas espera que a
instituição mude para se adequar a ele.
Vai manter o celibato, é? Então tá… Vá com Deus, Beto!
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